27/12/2024
Nas épocas de festividades se descolam dos recantos as canções sucessos do momento, contíguo ao apelo que têm do sucesso que cativa há nessas canções certo fascínio, carregam expressão da vida vivida daquele recorte estacional, carregam os sabores, exprimem o modo e as histórias copiosas de amar, ressoa a vida que me escapa, em alheamento.
Brota à garganta suspiro que cala. Travo. A topologia de preces aniquiladas é, afinal, mera abstração, quando esticado o sofrimento até arquear, e nisso não há consolo algum, somente rememoro quando o tempo se fincava abandonado, balão no ar, quando me demorava no quintal ao pé de duas escadas, cenário de toda sorte de brinquedos, personagens beligerantes em meio a lutas épicas, jogadores em meio a copas do mundo, no caderno mapas geográficos de países inexistentes.
Certa vez me interromperam a brincadeira, para que pudesse, com eles, pisar sobre a nova avenida inaugurada no dia. Avenida grande, ainda não aberta para carros, cinza e branca, e os muitos visitantes errantes e dispersos não dissimulavam a sensação de solidão que o grande espaço escancarava, liso e repassado de pó de construção.
Avenida Novo Osasco. Falavam então que tudo da cidade é outro, no lugar houvera grande rio que invadia as ruas, as casas, alagava. Depois, vieram a recortar o rio encanado grandes listras de pedra, e até esses pedaços de concreto foram afirmação de histórias da grande coragem.
Meu caminhar cotidiano passado, que compõe esboço de esgar acanhado diante da vida, são ruas íngremes e abruptas, descidas, repetições e esquecimento, salgueiro ancião a carpir, as lágrimas petrificadas, outra árvore a morada de morcegos, portões enferrujados, baús sufocantes, ideias lúgubres, medo do suplício, quintal ao fundo onde se represou a água verde da chuva temperamental, menina furtiva e mãe, ônibus empanturrado de gente rumo ao campo, até a boca da grande fila, para a oferenda da prenda de maçãs frescas e brinquedos.
Edifício isolado ao canto da casa, em seu contorno abraçada escada de ferro espiral, os pés fincados no topo, de repente se despontava enquanto inesperado mirante dos bairros sobrepostos, mas tudo era noite e sono. Lá subiam surradas histórias de demônios, de brigas violentas, e se ainda não se encorpavam episódios da boa boêmia ou dos êxitos junto às mulheres, havia já os jogos da posse. Para fingir cegueira não é preciso, nem sequer conveniente, fechar os olhos. Relatos do terrível, fumegar de crimes, crueldades, injúrias, não mais espantavam, assim como, por outro lado, não trazia novidade o entusiasmo do que promete felicidade e é faustoso. Manchada a palavra, crendices inquietas e desajeitadas esculpiram torvelinho malsão e maldito.
Aqui a chuva do verão infante volve a abraçar o ar pesado, escorrem bolhas sobre o asfalto, a televisão transmite coisas repetidas, nos recantos as festas se esvaem, tudo parece estar de férias em algum lugar distante, onde o céu se demora pálido e suave. Não se sabe acerca da maquinação da vida a vir, e o passado… Electra! Estourou a tragédia, você pôs na palma das mãos toda a dor, a dor que faz estremecer a espinha de deuses, e em sudário tingido de lendas rubras se metamorfoseou a sangue pássaro a ulular a canção de tinos e lamento!